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Reciclagem e Coleta Seletiva: O Desafio de Cabo Frio na Gestão de Resíduos Sólidos

Foto do escritor: AECAEC

Desafios no manejo de resíduos sólidos colocam Cabo Frio em busca de soluções sustentáveis para aumentar a reciclagem e reduzir o impacto ambiental


Por: Luana Marcelino Daher, Eduarda Lobo dos Santos e Ana Clara Tavares Silva


Imagem Comsercaf

Cabo Frio enfrenta um desafio significativo na gestão de resíduos sólidos, especialmente em períodos de alta temporada, como feriados e festividades. Somente na Praia do Forte, foram retiradas 120 toneladas de resíduos após a celebração do Ano Novo em 2019, totalizando cerca de 2 mil toneladas em todo o município durante o fim de semana, segundo o site da Comsercaf, empresa responsável pela coleta de lixo em Cabo Frio.

Nesse cenário, iniciativas individuais e comunitárias tentam diminuir o impacto ambiental, embora a cidade ainda tenha um longo caminho pela frente. Um destes exemplo vem de Rodrigo Macedo, coletor concursado da Comsercaf há 25 anos, que compartilhou sua experiência em uma entrevista exclusiva à nossa equipe, revelando como decidiu iniciar um projeto de conscientização nas praias. “Nós começamos a distribuir nas praias sacolas com instruções para que os moradores e visitantes pudessem se engajar na coleta de resíduos”, explica. Sempre atento, ao notar que alguns locais voluntariamente separavam os recicláveis do lixo orgânico, Rodrigo se uniu a outros catadores e juntos fundaram a COOPERFORTE, primeira cooperativa de reciclagem da cidade. Foi ele também quem criou a "Recicleta", uma bicicleta adaptada que percorre as ruas da cidade em busca de materiais que possam ser reaproveitados. “A Recicleta é uma maneira de incentivar o engajamento da população e de mostrar que pequenas ações fazem a diferença”, destaca Rodrigo.


Recicleta / Foto: Luana Daher

A importância dos catadores para a sustentabilidade da cidade também é reforçada por Rodrigo, que acredita que a regulamentação desses trabalhadores é essencial. “Sem esses profissionais, a cidade não suportaria o volume de lixo gerado”, ele afirma, enfatizando a necessidade de garantir condições dignas de trabalho e remuneração justa, de modo que possam continuar atuando com segurança e eficiência. Segundo o Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR), 70% desses trabalhadores são mulheres, majoritariamente negras e chefes de família, muitas vezes enfrentando condições precárias de trabalho. Esse setor já movimenta aproximadamente R$ 12 bilhões de reais por ano e tem potencial de movimentar outros R$ 14 bilhões nas próximas décadas. As estimativas indicam que o reaproveitamento pode gerar até um milhão de empregos diretos. A valorização desses profissionais contribui para a continuidade deste trabalho que é essencial para o meio ambiente, aumentando a vida útil dos aterros e reduzindo a demanda por novos recursos naturais, em conformidade com as metas da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS).

Outro exemplo importante em Cabo Frio é a Cooperben, cooperativa presidida por Antônio Carlos, que proporciona renda para cerca de 34 famílias e promove conscientização ambiental em empresas e condomínios. A cooperativa, totalmente legalizada, é também responsável pela reciclagem de resíduos gerados em grandes eventos como Cabo Folia e pela coleta dos resíduos da Marinha do Brasil. “Estamos sempre em busca de subsídios para ampliar nossa atuação e adquirir equipamentos. Queremos que nossa cidade seja um exemplo de sustentabilidade”, declara Antônio Carlos em entrevista à nossa equipe. 


PEV Jojoca. Foto: Luana Daher
COOPERBEN. Foto: Reprodução

Dentre as iniciativas locais, Cabo Frio inaugurou em 2021 seu primeiro PEV (Ponto de Entrega Voluntária) no Horto Municipal, em homenagem a José Vinícius Barbosa, o “Jojoca”, que dedicou sua vida à coleta de recicláveis. O PEV se tornou um espaço importante para que moradores descartem os resíduos sólidos de maneira responsável e eficiente, fortalecendo a prática de reciclagem no município. No entanto, para que ações como essa se tornem efetivamente transformadoras, é indispensável o fortalecimento de políticas públicas de reciclagem e coleta seletiva que amplifiquem esses esforços e engajem a comunidade como um todo. 



Uma comparação com outras cidades brasileiras evidencia os atrasos na busca por sustentabilidade em Cabo Frio. A cidade Curitiba, capital do Paraná, é considerada uma das cidades mais limpas do Brasil e do mundo, por exemplo, e é referência em gestão de resíduos, reciclando 2,7% de seu lixo, enquanto em Cabo Frio esse índice é praticamente zero. Santana de Parnaíba, uma cidade de pequeno porte da grande São Paulo, tem coleta seletiva diária porta a porta e recicla 3,81% de seus resíduos. Em contraste, Arraial do Cabo, vizinha de Cabo Frio, trata apenas 0,09% de seu lixo

Impactos ambientais 


Uma pesquisa de 2017 realizado pela Universidade de São Paulo (USP) aponta que a reciclagem de materiais como papel, plástico, vidro e metal reduz a quantidade de lixo destinados a aterros sanitários, diminuindo a poluição do solo e da água. Consequentemente, a reutilização de materiais contribui para a conservação de recursos naturais, diminuindo a necessidade de extração de matérias-primas. 


Além disso, o manejo inadequado de resíduos sólidos não só polui o solo, como também contamina os lençóis freáticos, prejudicando a qualidade da água potável, aumentando os custos de tratamento. Esse foi o assunto de uma palestra ministrada em 2023, por Élen Dânia, superintendente de Resíduos Sólidos da Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento Básico do Distrito Federal (Adasa), num dos painéis da Semana da Água. Na ocasião, ela alertou sobre os danos causados à população pelo descarte irregular de resíduos sólidos.


“As consequências destas práticas têm impacto direto na qualidade da água que chega ao consumidor, e consequentemente, na saúde pública. A contaminação dos mananciais favorece a transmissão de doenças como hepatite, cólera e leptospirose, pela água”, afirma Dânia.

Para além do meio ambiente, é também possível sentir os impactos na economia. Um levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), revelou que, em 2009, o Brasil desperdiçou cerca de R$ 8 bilhões em materiais recicláveis. Atualmente, apenas 13% do lixo gerado no Brasil é reciclado, um número bem inferior à meta prevista no Decreto nº 7.404, de 23 de dezembro de 2010, que estabelece a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos. O decreto prevê que 25% dos materiais retornem ao ciclo produtivo, evidenciando o grande potencial ainda inexplorado.


O exemplo que vem de fora


Na arena global, diversos países vêm fazendo sua parte e a Suécia é frequentemente citada como exemplo inspirador. Com um sistema consolidado de reciclagem e educação ambiental, o país recicla anualmente 1,5 bilhão de garrafas e latas e destina menos de 1% do lixo para aterros, transformando-o em fonte de energia. Esse modelo de sucesso só é possível graças à conscientização da população, que colabora ativamente, separando resíduos e os entregando em centros de coleta. O Viskan, principal rio de Borås, cidade ao sul da Suécia, é um símbolo desse avanço: antes poluído a ponto de afastar moradores devido ao mau cheiro, hoje representa o renascimento ambiental. O processo de revitalização do rio demonstra que projetos de educação ambiental e políticas públicas eficazes têm o poder de transformar o que parecia irrecuperável em algo belo e sustentável.


Rio Viskan, Suécia. Foto: Reprodução

Estolcomo, Suécia. Foto: Reprodução.

Para que Cabo Frio trilhe um caminho semelhante e se torne referência nacional em sustentabilidade, é essencial implementar políticas públicas que incentivem a coleta seletiva e regulamentem o trabalho dos catadores. A sociedade civil também deve se engajar, adotando práticas de descarte e reciclagem conscientes. Assim como Borås encontrou nova vida em suas águas, Cabo Frio pode renascer como um exemplo de compromisso ambiental. A união entre o poder público e a população pode dar à cidade a chance de construir um futuro em que a natureza e o desenvolvimento caminhem lado a lado.

 

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